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12 DE JUNHO DE 2023
Menos de 100 contratos de namoro são registrados por ano no Brasil
A formalização do namoro derivou da necessidade de resguardar patrimônio individual após fim da relação afetiva. Veja como e quando se deve fazer o documento.
“a vida é breve, e o amor mais breve ainda…”
Mário Quintana
Colocar tudo no papel, quando se trata de namoro, é uma tendência moderna. Não se trata de união estável, muito menos de casamento: é simplesmente o namoro tutelado pela lei, resguardando o patrimônio individual dos apaixonados.
Em uma realidade de relacionamentos cada vez mais efêmeros, a autorização para esse tipo de contrato no ordenamento jurídico pátrio, e a sutil diferença entre ele e a união estável, são temas que instauram muitas dúvidas nas cabeças e corações dos brasileiros.
Amar… verbo intransitivo?
Se as relações forem idealizadas pelo princípio exclusivo do afeto, contrato de namoro é uma expressão com termos aparentemente inconciliáveis. Amar pode ser verbo intransitivo, mas não é intransigível: é possível harmonizar o namoro romântico com a racionalidade de um ato contratual.
Ainda visto como novidade, nem sempre aceitável, o contrato de namoro é prova de que novas configurações de relacionamentos resvalam no Direito Civil, o qual admite situações mais amplas do que o casamento e a união estável.
O modelo clássico de relação afetiva, herança da legislação portuguesa, não via abertura para um namoro com efeitos patrimoniais, porque, na época, o namoro era uma relação incipiente, restrita, um ensaio para o futuro matrimônio. Mas o tempo agora corre em ritmo baumaniano… tudo é líquido.
De fato, lá se foi o trovadorismo. E os casais, temerosos dos efeitos de amores cada vez mais oscilantes, passaram a resguardar seus direitos. E como o ChatGPT não explica como se resguardar de uma desilusão amorosa, a solução é depositar as fichas na proteção do patrimônio individual.
É nesse contexto que casais passaram a recorrer ao formato extrajudicial de formalização do namoro, via contrato. O principal escopo é evitar eventual confusão patrimonial decorrente do término da relação e, de acordo com Giselle Oliveira de Barros, presidente do Colégio Notarial do Brasil, privilegiar a segurança jurídica.
“A segurança jurídica de uma relação pode ser garantida nas mais diversas formatações de relacionamento, incluindo os que querem garantias durante aquele período de ‘conhecer melhor’ o seu parceiro, sem se comprometer com a intenção de formar uma família. É uma forma de estabelecer uma linha concreta entre um namoro e uma união estável, evitando uma possível confusão patrimonial durante este período da relação.”
Em termos de legislação, pelo princípio civilista da autonomia da vontade, o contrato de namoro é possível como contrato atípico, conforme art. 425 do CC, pois toda pessoa capaz tem o direito de contratar da forma que lhe convier. Assim, desde que personalíssimo, resultante da vontade entre partes livres e capazes e ausente fator impeditivo, o contrato será válido.
Portanto, se as partes são capazes e consensualmente estabelecem contrato, o Estado, em respeito ao princípio de intervenção mínimo na vida privada, não deve privá-las de firmar um contrato de namoro.
O contrato de namoro em tempos de união estável
Um dos pontos mais sensíveis a respeito do contrato de namoro é a tênue linha entre ele e a união estável. Esta foi reconhecida como entidade familiar pela Constituição de 1988 e regulamentada pelo CC.
Conforme o art. 1.723 do CC, a união estável é reconhecida como a união entre homem e mulher, em convivência pública, contínua e duradoura, com o objetivo de constituição de família, equiparada ao casamento e sujeita aos mesmos impedimentos deste. Observe que a redação do CC já ficou vetusta, pois, desde 2011 o STF reconhece a união estável entre pessoas do mesmo sexo. Além disso, conforme o art. 226, §3º da CF, a conversão da união estável em casamento deve ser facilitada pela lei.
Por sua vez, no contrato de namoro, segundo o juiz de Direito e professor, Pablo Stolze Gagliano os indivíduos declaram ser namorados e há ausência da intenção de constituir família.
“Trata-se de um negócio celebrado por duas pessoas que mantêm relacionamento amoroso – namoro, em linguagem comum – e que pretendem, por meio da assinatura de um documento, a ser arquivado em cartório, afastar os efeitos da união estável.”
Foi nesse sentido que, em 2012, a 3ª turma do STJ proferiu decisão no REsp 1263015/RN. De acordo com a relatora, ministra Nancy Andrighi, o “desejo de constituir uma família […] é essencial para caracterizar a união estável, pois distingue um relacionamento, dando-lhe a marca da união estável, ante outros tantos que, embora públicos, duradouros e não raras vezes com prole, não têm o escopo de serem família, porque assim não quiseram seus atores principais”.
O namoro, afinal, trata-se de relação de afetividade na qual as pessoas partilham momentos com parcela menor de responsabilidades e após o fim da relação, independentemente do tempo convivido, cada um ficará com os respectivos bens individuais.
Carlos E. Elias de Oliveira, professor de direito civil e notarial e consultor legislativo do Senado, aponta que a contratualização de um relacionamento afetivo pode gerar mal-estar pela sensação de falta de confiança. Aliás, é esse aspecto cultural que influencia na decisão de contratualizar um namoro.
Ainda, segundo o professor, é pela razão da maturidade que o contrato de namoro no Brasil costuma ser feito por casais com maior bagagem de vida e/ou por pessoas com patrimônio já consolidado, ou com filhos de relacionamentos anteriores.
Números
De acordo com dados do Colégio Notarial do Brasil, de 2007 a 2015 a quantidade de contratos de namoro firmados no Brasil foi bastante baixa, atingiu patamares máximos de sete contratos anuais em dois anos.
Os números aumentaram a partir de 2016, quando foram registrados 26 contratos do gênero. O ápice, entretanto, ocorreu em 2022, quando 92 contratos de namoro foram contabilizados.
Esse aumento recente, segundo o Colégio Notarial do Brasil, pode ser explicado pelo período de pandemia, quando muitos casais de namorados passaram a morar com seus parceiros, mesmo sem a intenção de constituir família.
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Fontes:
GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil, volume 6: direito de família /Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho. – 7. ed. – São Paulo: Saraiva, 2017. 1. Direito Civil – brasil 2. Direito de família – Brasil I. Pamplona Filho, Rodolfo II. Titulo. 16-1552 CDU 347.6
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Fonte: Migalhas
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