NOTÍCIAS
22 DE ABRIL DE 2024
Reforma do Código Civil exclui cônjuges da lista de herdeiros necessários
Entregue ao Senado Federal na quarta-feira (17/4) pela comissão de juristas responsável por sua elaboração, o anteprojeto de reforma do Código Civil apresenta uma novidade importante sobre sucessões: os cônjuges deixam de ser herdeiros necessários.
Pela redação atual (de 2002) do artigo 1.845 do Código, os herdeiros necessários são os descendentes (filhos e netos), os ascendentes (pais e avós) e os cônjuges.
Isso lhes garante direito a uma parte da herança legítima, que equivale a metade dos bens do falecido. Ou seja, 50% do patrimônio obrigatoriamente é destinado a todas essas pessoas e deve ser dividido entre elas.
Caso o texto sugerido pela comissão seja aprovado, o cônjuge será excluído do artigo 1.845 do Código Civil, uma medida que é bem vista por boa parte dos especialistas em Direito de Família e das Sucessões.
Regra atual
A advogada Silvia Felipe Marzagão, presidente da Comissão Especial de Família e Sucessões da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), explica que o cônjuge ou companheiro é considerado herdeiro “mesmo havendo regime de separação convencional estabelecido em vida”.
Hoje, o cônjuge só perde o direito à herança legítima se for deserdado “ou eventualmente declarado indigno”, conforme indica a advogada Maria Berenice Dias, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).
Em alguns regimes de bens, o cônjuge tem direito à meação, que corresponde à metade do total dos bens que integram o patrimônio comum do casal, adquirido em vida. Rafaella Almeida, associada de Família e Sucessões do escritório Trench Rossi Watanabe, ressalta que a proposta da comissão não altera essa possibilidade.
Mesmo se deixar de ser herdeiro necessário, o cônjuge ainda continuará na ordem de sucessão hereditária prevista no artigo 1.829 do Código Civil. Os cônjuges ou conviventes são os terceiros nessa ordem, atrás de descendentes e ascendentes.
Isso significa que, se não houver um testamento, os bens são destinados aos descendentes e ascendentes. Na ausência deles, a transmissão é feita ao cônjuge.
Rafaella, porém, destaca que o cônjuge ainda poderia ser excluído da ordem de sucessão pelo testador, que poderia incluir tal previsão no testamento ou não contemplar o cônjuge ao dispor seu patrimônio.
Adequando o Código
Em 2017, o Supremo Tribunal Federal decidiu que companheiros (de uma união estável) e cônjuges têm os mesmos direitos de herança.
Na ocasião, no entanto, a corte não deixou claro se os companheiros também poderiam ser considerados herdeiros necessários, o que gerou controvérsia. A solução encontrada pela comissão de revisão do Código Civil foi excluir os cônjuges — e, consequentemente, os companheiros — do artigo 1.845.
O presidente do IBDFAM, Rodrigo da Cunha Pereira, afirma que a proposta “vem corrigir um grande erro do Código Civil de 2002”, que abriu uma “rota das injustiças”. O advogado sempre entendeu que companheiros não são herdeiros necessários.
Maior autonomia
Silvia Marzagão afirma que a proposta da comissão é positiva, pois “amplia a autonomia do autor da herança para dispor de seus bens”. A partir da mudança, seria possível “pensar em completa dissociação patrimonial entre os cônjuges ou companheiros, tanto em vida quanto após a morte”.
Felipe Matte Russomanno, sócio da área de Família e Sucessões do escritório Cescon Barrieu, também vê a alteração com bons olhos “porque ela permite uma maior disponibilidade sobre o patrimônio e a herança como um todo”.
Rafaella Almeida concorda que “a nova redação do dispositivo visa a promover a autonomia privada do testador, caso não seja de seu interesse dispor de seus bens ao cônjuge”.
Assim, o testador poderá organizar a herança da forma que preferir, dentro dos limites da herança legítima. “O objetivo da alteração é que o casamento deixe de ser um óbice ao direito de dispor do patrimônio próprio”, assinala a advogada.
Russomanno ressalta que, além da herança legítima, também existe a disponível, correspondente à outra metade do patrimônio. A pessoa pode dispor dessa parte dos bens da maneira como quiser.
Planejamento sucessório
Outro benefício identificado por Rafaella é o estímulo ao planejamento sucessório, que se refere às estratégias de organização para a transmissão dos bens aos herdeiros.
Segundo ela, os casais “poderão endereçar as suas vontades por meio de testamentos e pactos antenupciais, a fim de que não seja necessário escalar a questão judicialmente”.
Russomanno destaca que o planejamento sucessório “tem se tornado uma prática cada vez mais utilizada no Brasil”, embora ainda não seja popular.
Mesmo se for aprovada a alteração no texto do Código Civil, quem quiser contemplar o cônjuge com patrimônio ainda poderá usar o testamento ou outros mecanismos de planejamento sucessório. “Isso não significa necessariamente um prejuízo a cônjuges, mas, sim, uma maior disposição”, pontua o advogado.
Problemas
Por outro lado, Maria Berenice Dias diz que a regra proposta pela comissão “exclui direitos que haviam sido assegurados no Código Civil de 2002”. O problema, para ela, é que normalmente o patrimônio de um casal fica no nome do homem. Na visão da advogada, isso é fruto de uma sociedade conservadora, machista e fundamentalista.
A vice-presidente do IBDFAM reconhece que o anteprojeto estabeleceu alguns direitos sucessórios ao cônjuge e ao companheiro, “mas todos transitórios”.
Outro artigo do novo texto diz que o juiz poderá “instituir usufruto sobre determinados bens da herança para garantir a subsistência” do cônjuge ou sobrevivente caso haja “insuficiência de recursos ou de patrimônio”.
No entanto, o dispositivo estipula que isso deixará de valer quando a pessoa “tiver renda ou patrimônio suficiente para manter sua subsistência” ou quando “constituir nova entidade familiar”.
Esta última condição é classificada por Maria Berenice como “um absurdo”, pois “acaba impondo um celibato a quem recebe esse eventual direito”.
Em outras palavras, o direito só vale se a pessoa “se mantiver fiel ao defunto”, sem a possibilidade de formar uma nova família após a morte do antigo cônjuge ou companheiro.
Outras mudanças
A advogada elogia um outro ponto do anteprojeto relacionado ao mesmo tema: a exclusão do direito dos cônjuges a um quarto da herança sobre os bens particulares — ou seja, bens que o outro cônjuge ou companheiro tinha antes do casamento ou da união estável, além daqueles recebidos por doação ou herança.
O artigo 1.832 do atual Código Civil garante ao cônjuge, caso seja ascendente dos outros herdeiros com quem concorrer, a reserva de um quarto da herança. A proposta da comissão acaba com essa regra.
Na opinião da vice-presidente do IBDFAM, a regra atual “sempre foi causa de um enriquecimento injustificado, porque esse patrimônio foi amealhado independentemente da participação do outro”.
O máximo que a advogada enxerga como possível é garantir ao cônjuge ou companheiro esse direito de concorrência sobre os bens adquiridos durante o casamento ou a união estável.
Segundo ela, são comuns as chamadas famílias recompostas, nas quais alguém divorciado ou viúvo se casa novamente com outra pessoa ou inicia uma união estável.
Hoje, o novo cônjuge ou companheiro fica com uma fatia dos bens particulares dessa pessoa. Isso, segundo Maria Berenice, gera conflitos e faz com que os filhos tentem impedir os pais (que tenham algum patrimônio) de constituir novos relacionamentos.
Fonte: Conjur
Outras Notícias
Anoreg RS
05 DE JULHO DE 2024
Medidas do Governo Federal para aprimorar o registro civil de nascimento são apresentadas em evento internacional
Brasil relatou a realização de mutirões para atender grupos vulnerabilizados, como pessoas em situação de rua e...
Anoreg RS
04 DE JULHO DE 2024
Audiência discute direitos trabalhistas de representantes de serviços notariais
Serviços notariais são atividades realizadas por cartórios, como autenticação de documentos e emissão de...
Anoreg RS
04 DE JULHO DE 2024
Pessoa em situação de rua terá prioridade na emissão de documentos, aprova CDH
A Comissão de Direitos Humanos (CDH) aprovou nesta quarta-feira (3) projeto de lei que torna prioritário e...
Anoreg RS
04 DE JULHO DE 2024
Adiada apreciação de projeto que favorece regularização fundiária na Amazônia
A Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) adiou a apreciação do projeto de lei que cria processo...
Anoreg RS
04 DE JULHO DE 2024
Artigo – Partilha sobre valorização das cotas sociais na reforma do Código Civil
Com grande entusiasmo e reflexão, a comunidade jurídica recebeu no primeiro semestre de 2024 o relatório...